"Hoje executarei meus versos na flauta de minhas próprias vértebras." (Maiakóvski) Se eu tivesse força suficiente para negar aquilo que em mim transforma pó em palavra, Deixaria cada uma de minhas páginas descansando sob meus sapatos Levaria adiante apenas aquele silêncio típico dos que alcançam o paraíso. Mas essa fraqueza que me arrasta, escreve para merecer a luz que cada um comunga com as estrelas. (Substância primeira Instância derradeira) Se eu tivesse força suficiente, negaria cada um dos verbos que se movem para compor minha desordem E seguiria com a aparência leve. Mas sei que nenhuma ausência transpira um verso honesto. O poeta surge de corpo aberto e alma derramada, Sua escrita corre e se espalha pesando sobre os móveis, sujando as unhas, dando a cara a tapa. Se eu tivesse força suficiente, quereria apenas a parte que me cabe. Só que minha natureza é a dos fracos Dos que carregam seus ossos expostos Dos que não resistem Dos que não se calam.
da minha cidade Há muito, dormir deixou de ser importante O tempo de sonhar já acabou Guardo apenas a leve sensação do sono Que é azul e também amarelo Para que assim permaneça Escrito com luz no meu sorriso (Quando lembro das noites de paz). Manter-se acordado é imperativo Porque a vida é urgente E se piscar o olho... Passou. Cresce, corre, ama, casa, trabalha... Seja feliz! Cadê a calma? Cadê a alma? - Fugiu com o passarinho verde Que bateu asas e voou.
"Ninguém alguma vez ou pintou, esculpiu, modelou, construiu ou inventou senão para sair do inferno." (Antonin Artaud)
Da última vez que te vi Restaram pedaços de tarde. Aquelas horas sem infância Cheias de aranhas verdes Que enfeitam os corações com teias Ainda que não tenham esperança. # Da última vez que te vi Restaram alguns fios de barba Prendendo o sol no lábio mudo. Escondido no riso disfarçado, Mora o que não cabe no mundo. # Da última vez que te vi Restaram poemas náufragos. Ainda bóiam num certo lago... Carecem de vento que os arraste Para um chão que seja surdo. # Da última vez que te vi Restaram sonhos e arestas. O poeta entrou para o Convento Num silêncio maior que novembro. Porém, um beijo no mirante gritou Nada morre se algo ainda resta.